“Se fazem assim com a árvore
verde, o que não farão com a árvore seca?” (Lc 23,31)
Jesus fala de si mesmo como uma
árvore verde. E não é de se estranhar: De fato, no caminho do calvário, quando
Ele profere essas palavras, está carregando um madeiro de árvore cortada: a
Cruz. A árvore verde é árvore viva que dá frutos. A árvore seca é árvore sem
vida, sem frutos. Hoje, na dolorosa paixão do Cristo, a árvore da Cruz parece
mais uma árvore seca do que uma árvore verde. Quitaram a vida da árvore verde -
do Cristo – no madeiro da Cruz. Secaram-na de vida. E, não obstante, essa
árvore seca produz seu fruto de vida para todos: ‘eis o lenho da Cruz da qual
pendeu a salvação do mundo’. As queimadas, o extrativismo, o desmatamento para
o uso desmedido do agronegócio e pecuária mudam milhões de árvores verdes em
árvores secas. A Criação geme em dores de Cruz. Os biomas brasileiros estão
ameaçados pela secura dos corações
que tratam a Casa Comum como casa de ninguém.
“Se fazem assim com a árvore verde, o que não farão com a árvore seca?”
(Lc 23,31).
Essas palavras de Jesus são
dirigidas às mulheres que ele encontra em uma das estações da Via Crucis às quais Ele recomenda que
não chorem por Ele, mas por elas mesmas e pelos seus descendentes (cf. Lc 23,28).
Chorai pelos que virão, disse Jesus. Chorai hoje pelos descendentes dos povos
que mais padecem com a exploração da Mãe Terra, chorai, hoje, com os
empobrecidos, com os ribeirinhos, os quilombolas e os povos indígenas.
Nesse ano, com a exortação
apostólica pós-sinodal Querida Amazônia, do papa Francisco, nossos
corações se voltam para aquela realidade e seus povos. Aqui também se encontra
o rosto do Cristo padecente, o rosto de Cristo encarnado no rosto dos povos amazônicos: é o rosto da Igreja amazônica. É um rosto também sofredor de povos que
resistem e lutam. “Não desviei o rosto
de bofetões e cusparadas. Mas o Senhor Deus é meu Auxiliador, por isso não
deixei abater o ânimo, conservei o rosto
impassível como pedra, porque sei que não sairei humilhado” (Is 50, 6-7). Cristo
padece bofetões e cusparadas na Amazônia. “Transpassaram minhas mãos e os meus
pés e eu posso contar todos os meus ossos” (Sl 21). Os territórios tradicionais
indígenas são transpassados e retalhados por fazendeiros. “Cães numerosos me
rodeiam furiosos e por um bando de malvados fui cercado” (Sl 21). A atual
política de demarcação da terra cerca os territórios dos povos tradicionais por
regiões de plantio e cria de gado, onde já não é mais possível caçar e pescar
para a sobrevivência.
“Se fazem assim com a árvore verde, o que não farão com a árvore seca?”
(Lc 23,31).
O Domingo de Ramos contém uma
referência também aos ramos do Evangelho da Procissão de Ramos. Os ramos são a
manifestação expressiva do povo que acolhe o Senhor como profeta poderoso em
Jerusalém. Nesse episódio, “do meio da multidão, alguns dos fariseus disseram a
Jesus: ‘Mestre, repreende teus discípulos!’ Jesus, porém, respondeu: ‘Eu vos
declaro: se eles se calarem, as pedras gritarão’”. De rosto impassível como
pedra (cf. Is 50,7) os povos amazônicos seguem sua luta pela vida em suas
terras. Este é o rosto da Igreja Amazônica: Um rosto resistente e forte. Pois,
se os discípulos de Jesus se calarem, as pedras gritarão, seus rostos
impassíveis como pedra gritarão, e até os ramos das palmeiras de oliveira
gritarão, os ramos de açaí gritarão, os ramos de coco e tucumã gritarão, os
ramos de buriti gritarão, a Floresta gritará; caso os discípulos de Jesus se
calarem na Amazônia.