Distantes, de braços cruzados, os pais buscavam respostas prontas para perguntas práticas. Eles não estavam ali para refletir, para ter um momento de intimidade com a Palavra de Deus. Eles estavam ali para uma reunião no estilo “pais e mestres” da escola e não para um encontro de catequese familiar. Os catequistas ficaram acuados e sem grandes esperanças de que o que haviam preparado naquela ocasião com aqueles pais daria certo, estava mais para uma perda de tempo. Mas, seguiram com tudo conforme o planejado. Aquele episódio inquietou os catequistas. Como poderiam educar na fé as crianças de pais que parecem indiferentes à catequese a não ser por perguntas como “Ele está se comportando bem? Está aprendendo direito?”, como se falassem a um professor da escola onde seus filhos estudam? Em geral, não de tinha o apoio dos pais como primeiros catequistas, como transmissores da fé... Então, aquele grupo deu-se conta que era preciso desenvolver uma iniciativa com os pais conjunta à iniciação cristã de seus filhos. Do contrário, a catequese infantil, em grande parte, estaria fadada à esterilidade e à frieza de fé. Seriam novas crianças que iriam receber o sacramento e depois “sumir” da Igreja...
Em geral, os catequistas sabem que, muitas vezes, as famílias não são aliadas à catequese na evangelização de seus filhos e que, distante da vida da Igreja, elas também precisam ser evangelizadas e não poucas vezes (re)iniciadas na fé. Quando o catequista chega a essa conclusão, esse é um momento importante da tomada de consciência de uma das falhas do nosso modelo de catequese tradicional. O catequista depara com um desafio à frente e a próxima pergunta que se segue é “O que fazer? Que tipo de iniciativa podemos desenvolver com os pais dessas crianças? Como fazer isso?”.
A catequese familiar é indispensável na iniciação à vida cristã das crianças
O Instrumentum Laboris do sínodo dos bispos dá algumas pistas de ação:
1)
Afirma “a importância de uma estreita
colaboração entre as famílias/casas e a paróquia, na missão de evangelizar,
assim como a necessidade do envolvimento
ativo da família na vida paroquial, através de atividades de
subsidiariedade e solidariedade a favor de outras famílias” (nº 48). Trata-se
de encorajar iniciativas que de diversas maneiras incluam a parceria das
famílias nos projetos e ações pastorais, sobretudo de caráter social, que a
comunidade paroquial realiza. São exemplos os hospitais, orfanatos, casas de
repouso, instituições para menores e outros ambientes assistidos
espiritualmente pela paróquia; gestos concretos com as famílias mais pobres e
em sofrimento; participação nas atividades dos grupos e pastorais sociais da
paróquia, etc.
2)
“Faz-se presente a necessidade de que a
catequese assuma uma dimensão intergeracional, que envolva ativamente os pais no percurso de iniciação cristã dos próprios
filhos” (nº 49). Como é que os pais participam no processo de catequese de
seus filhos? Criamos as condições adequadas para que isso aconteça? Os
encontros de catequese familiar com os pais são um bom testemunho, ainda mais
se para além de um momento formativo, oferecemos as condições mínimas e as
orientações para que os pais continuem no lar a catequese aprofundada na
igreja, seja por meio de propostas de atividades e reflexões para serem feitas
em família, ou seja na instrução dos pais para criar no cotidiano da vida
familiar espaço para a vivência da fé.
3)
O texto lembra ainda a necessária “atenção às festas litúrgicas, como o
tempo de Natal e sobretudo a festa da Sagrada Família, como momentos preciosos
para mostrar a importância da família e apreender o contexto humano no qual
Jesus cresceu, no qual aprendeu a falar, amar, rezar e trabalhar”. São as
grandes celebrações que precisam ser preparadas com antecedência para as famílias e com as famílias. Se a sua catequese for de inspiração catecumenal e
o itinerário de catequese dos iniciandos forem marcados pelas celebrações –
ritos (aqueles que são previstos no
Ritual da Iniciação Cristã de Adultos), envolva os pais nos ritos das
celebrações! O texto indica ainda a
importância do “domingo como dia do
Senhor; como dia no qual favorecer o encontro na família e com as outras
famílias” (nº 49). Aqui ele está falando não só das missas do Domingo, mas
também de outros momentos como as festas das famílias que são ocasiões de
convivência entre os pais das crianças da catequese.
4)
É “frisada a importância da oração em família, (...) a fim de
alimentar uma verdadeira «cultura familiar de oração»”. O único jeito de
ensinar as famílias a rezarem é rezando com elas! A catequese precisa propor
momentos de oração, espiritualidade, retiros e devoções com as famílias. Nos
encontros de catequese familiar com os pais, o desafio é despertar neles a
responsabilidade de uma vida de oração. Rezar junto com os seus filhos é
considerada “uma forma eficaz para transmitir a fé às crianças”. O texto insiste
ainda sobre as propostas de “leitura comum da Escritura, assim como sobre
outras formas de oração, como a bênção da mesa e a recitação do rosário” (nº
42).
5)
Outras iniciativas criativas também são
eficazes, tais como a peregrinação de uma imagem ou ícone de Nossa Senhora de
família em família, ou ainda a “«peregrinação do evangelho», que consiste na
colocação de um ícone e da Sagrada Escritura nas famílias, com o compromisso de
ler regularmente a Bíblia e rezar juntos durante um determinado período” (nº
57), entre outras iniciativas.
Embora todas essas indicações pastorais
sejam muito preciosas e colocá-las em prática seja uma grande conquista, não
podemos parar por aí...
Recentemente conheci uma
comunidade paroquial que vive um outro desafio. Lá, ao mesmo tempo em que as
crianças têm o encontro de catequese, os pais, em outro ambiente, têm um
encontro de catequese direcionado para eles. Todos gostam. Os pais vão ao salão
paroquial com os filhos, levam-nos até a sala onde acontece o encontro de
catequese. Já às portas, está a catequista esperando com um sorriso de
boas-vindas. Os pais seguem para outra sala onde outro catequista os aguarda.
Quando os encontros acabam, pais e filhos se reúnem de novo e participam juntos
da missa. Os catequistas sentem que a catequese vai bem, as crianças e suas
famílias participam dos encontros, das missas e de outras propostas feitas
pelos catequistas. Grande alegria dessa comunidade paroquial é que, desde que
adotaram essa metodologia de catequese com os pais, mesmo depois dessa fase de
catequese ter acabado e os encontros para os pais terem se encerrado, grande
parte das crianças continua participando das celebrações, junto com seus
familiares. Os catequistas estão convictos que isso é resultado do esforço pela
catequese familiar que já ocorre a quatro anos. Porém, agora a consciência
dessa comunidade aguçou-se e ela percebeu que, embora a maior parte das
famílias participem da missa, a grande maioria não passou a integrar as
pastorais, movimentos e serviços da comunidade, mesmo as crianças. Aqui o
desafio já é outro... como despertar essas famílias para a vida em comunidade?
O Instrumentum
Laboris do sínodo sobre a família nos diz que “a obra pastoral da Igreja é chamada a ajudar as famílias na sua tarefa
educacional, a começar pela iniciação cristã. A catequese e a formação
paroquial constituem instrumentos indispensáveis para apoiar a família
nesta tarefa de educação, de modo particular por ocasião da preparação para o
batismo, a crisma e a eucaristia” (nº 133). Mas além da catequese e dos
encontros de formação paroquial, o documento aponta também o “crescimento da
igreja doméstica através de encontros
pessoais e entre famílias, sobretudo cuidando da oração” (nº 133). Eis aí
um ponto chave! Os encontros pessoais, ou melhor, o acompanhamento individual!
Ingressa na vida em
comunidade aquele que se identifica com ela e só identifica-se com a comunidade
quem é acolhido, valorizado na sua individualidade e aberto ao anúncio da
Boa-Nova de Jesus Cristo, faz a experiência do encontro pessoal com Ele. A
Igreja é a facilitadora dessa experiência de encontro. A experiência de
catequese catecumenal feita pelos primeiros cristãos nos diz que essa adesão à
fé e à Igreja começa com um convite que é feito por alguém da comunidade dos
crentes e que seja próximo de quem é convidado ao seguimento de Jesus. Daí que
para nós catequistas e para toda a comunidade paroquial, isso implica, em
primeiro lugar, num testemunho de fé verdadeiro e no mínimo de proximidade e
amizade com quem se pretende evangelizar, sejam as crianças e jovens, sejam
suas famílias. Ora, qual outra maneira melhor de criar um vínculo saudável e
verdadeiro com as famílias dos iniciandos se não por meio de um atendimento
personalizado?
No texto do Instrumentum
Laboris, dá-se o exemplo de que “nas paróquias alemãs, (...) tanto as crianças como os pais são seguidos
por um grupo de catequistas que os acompanham ao longo do percurso catequético.
Nas cidades grandes parece mais complexo conseguir realizar uma abordagem
pastoral personalizada. De qualquer maneira, representa um desafio a
possibilidade de se aproximar com profunda atenção destas irmãs e destes
irmãos, de os acompanhar, ouvir e ajudar a expressar as interrogações que
residem no seu coração, de propor um itinerário que possa fazer renascer o
desejo de um aprofundamento da relação com o Senhor Jesus, também mediante autênticos vínculos comunitários”
(nº 148).
De fato, não é fácil
para os catequistas darem um atendimento personalizado a cada família que
acompanham. Mas ele não precisa fazer isso sozinho! A comunidade paroquial toda
pode ajudar! Mas é preciso ter a coragem
de sair da sala de catequese e ir ao encontro das famílias, de suas
realidades... (cf. Instrumentum Laboris, nº50).
Um
pretexto para mudar um contexto...
Dito de maneira
clara, não basta fazer alguns encontros com as famílias, é preciso conhecê-las
e deixar que elas conheçam você. O catequista também precisa esforçar-se por
ser amigo dos pais das crianças da catequese, precisa visitá-los.
Há diversas objeções
em relação a essa proposta, há aqueles que inclusive dizem que, da maneira como
a apresentamos aqui, atribui-se a ela uma importância indevida. Ouso dizer que
minha experiência pessoal mostra o contrário e que a maior parte das pessoas
que recusam-se a visitar seus iniciandos e suas famílias, na verdade, optam por
uma atitude de comodidade. Estreitar os laços entre a paróquia e as famílias
não é tarefa fácil, mas o resultado é surpreendente!
Não é a visita em si
que vai mudar alguma coisa, a visita é um pretexto...
Mas o que vai
acontecer a partir dela, é o que pode mudar o contexto...
Numa visita, entrasse
não só na casa, mas no lar de quem nos recebe, ou seja, no lugar e símbolo da
intimidade de quem nos acolhe (cf. Lc 19,
1-10). O catequista dá-se a conhecer, fala de si, e cria as condições
necessárias para que a família sinta-se à vontade para se expressar. É possível
que algumas famílias sintam-se “invadidas”, desconfortáveis com a iniciativa do
catequista, isso é normal. Abrir as portas de casa para um “estranho” nunca é
algo fácil, seja compreensivo e não se magoe caso a acolhida não seja das
melhores. É importante sempre manter o bom humor!
Para
uma primeira aproximação, principalmente se a família não for “católica
praticante”, a proposta é de uma conversa informal, simples e breve, não se
alongue com “sermões” ou orações. Na hora que for agendar a visita,
pessoalmente ou por telefone, uma postura formal pode ajudar com frases do
tipo: “Queremos conversar com vocês pais sobre a catequese de seu filho(a)”.
Mas lembre-se, esse “vale tudo” é apenas um pretexto
para aproximar-se das famílias, a formalidade não deve ser cultiva a partir da
primeira visita.
Algumas perguntas que
parecem óbvias – e que o catequista já sabe a resposta, servem para iniciar um
bate-papo descontraído e iniciar a reflexão desejada com os pais. “Vocês vão a
Igreja com o seu filho(a)?”, “Vocês têm o hábito de rezar juntos?”, “Costumam
conversar com ele(a) sobre o que viu na catequese?”. Na medida em que o
catequista falar de si, de sua experiência de vida em comunidade e também da
sua família, ele pode perguntar algo sobre a família que visita também, como
quem mora na casa, o cotidiano da família, etc. O importante é deixar a
conversa fluir naturalmente, valorizando as respostas da família e a partir
delas, dar continuidade ao bate-papo. Não dê sermões sobre participação na
missa, nos encontros e outras “broncas”, faça perguntas para suscitar a
reflexão dos pais sobre esses assuntos e, depois, explique porque eles são
importantes.
Se estiver próximo da
data dos sacramentos da penitência e da Eucaristia, pergunte aos pais se eles
acreditam estarem em condições de ajudarem seus filhos na confissão,
partilhando a experiência de como foi a sua primeira confissão e a celebração
da Primeira Eucaristia. Questione-os sobre a prática sacramental e investigue
as motivações que levaram eles a colocar seus filhos na catequese paroquial.
Consulte-os se, na opinião deles, seus filhos estão “preparados” para celebrar
os sacramentos. Na verdade, essa pergunta tem como intenção despertar os pais
quanto a sua própria “preparação” e vivência sacramental. Pois, como sabemos,
muitas vezes, “não são os pais que transmitem a fé aos filhos, mas vice-versa;
são os filhos que, abraçando-a, a comunicam a pais que, desde há tempos
abandonaram a prática cristã” (Instrumentum Laboris nº 137).
Evite fazer as
visitas sozinho, chame outros catequistas ou outras pessoas da comunidade. Um
trabalho conjunto com a pastoral da família, da acolhida, da visitação, ou
outros grupos que desenvolvam o ministério da visitação, é uma iniciativa
excelente, sobretudo para dar continuidade à primeira visita feita pelo
catequista, mas agora incluindo, pouco a pouco, momentos de oração e reflexão
com a Palavra de Deus.
As visitas criam laços e os laços criam comunidade!
O
atendimento personalizado às famílias dos iniciandos, aliado a proposta de
envolvimento na vida pastoral pode contribuir eficazmente para a integração
dessas famílias à vida da comunidade paroquial. Mas para que isso aconteça, não
basta o protagonismo do catequistas. O apoio do padre e do restante da
comunidade paroquial é indispensável! São eles que também se farão presentes
nos encontros de catequese familiar, nas visitas, nas celebrações, são eles a
propor e acompanhar o engajamento das famílias nas atividades das pastorais,
movimentos e serviços da comunidade paroquial encaminhados pelos catequistas de
modo a facilitar a integração deles, criando neles o sentimento e a certeza de
acolhida e pertença à Igreja.
De fato, o Instrumentum Laboris, no nº 146, assim sintetiza: “Entre
as experiências eclesiais eficazes e significativas, destinadas a contribuir
para o percurso destes pais, foram evidenciadas: as catequeses comunitárias e
familiares; os movimentos de apoio à pastoral conjugal; as missas dominicais;
as visitas às famílias; os grupos de oração; as missões populares; a vida das
comunidades eclesiais de base; os grupos de estudo bíblico; as atividades e a
pastoral dos movimentos eclesiais; a formação cristã oferecida aos pais das
crianças e dos jovens que frequentam os numerosos colégios e centros de
educação católica”.
Toda a criatividade e
boa vontade dos catequistas que querem se aproximar e evangelizar as famílias
dos iniciandos é muito bem-vinda. Porém, não se pode deixar de ter em conta as
orientações da Igreja que já existem sobre esse desafio.Texto de João Melo originalmente publicado em Revista Digital Sou Catequista, edição 7, ano 2, outubro/2014, págs, 40-50.
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