sábado, 27 de junho de 2020

Novo Diretório para a Catequese: Comentário, Download e indicações para tempo de Pandemia


Fiquei inquieto com o lançamento do novo Diretório para a Catequese (2020). De fato, tinha escutado por aí que o PONTIFÍCIO CONSELHO PARA A PROMOÇÃO DA NOVA EVANGELIZAÇÃO (PCNE), atual responsável pela catequese no Vaticano, iria deixar de existir com a reforma da Cúria empreendida pelo papa Francisco. Criado por Bento XVI, o PCNE assumiu a catequese no lugar da Congregação para o Clero. Mas o lançamento do Diretório para a Catequese nos leva a crer que esse órgão não deve deixar de existir tão cedo. Além desses dois organismos vaticanos, existe ainda a Congregação para a Evangelização dos Povos, chefiada pelo cardeal Tagle, que poderia muito bem assumir o trabalho do PCNE e a catequese. O número de departamentos da Cúria Romana ainda precisa ser enxugado. 

Apesar de lamentar alguns pontos do documento, a impressão que tive do Diretório para a Catequese é muito positiva. Temas extremamente importantes tiveram tratamento ampliado: migrantes, povos nativos (indígenas), população encarcerada, a temática da catequese e ecologia, a cultural digital, a explícita opção preferencial pelos pobres.. são todos apelos universais nos dias de hoje e que foram abarcados pelo texto. 

Acho que a maior deficiência do Diretório é o lugar não primordial que a Bíblia ocupa como fonte da catequese - ela figura entre as outras fontes. No Brasil a nossa “velha” ‘Catequese Renovada’ já afirmava o lugar essencial do Bíblia em 1983. O cardeal Fisichella, chefe do PCNE, situa o Diretório na comemoração de aniversário de publicação do Catecismo da Igreja Católica. O PCNE parece valorizar mais o Catecismo e menos a Bíblia na catequese. É como o próprio Fisichella falou durante a apresentação do novo Diretório, a comemoração do Catecismo toca diretamente o departamento dele, visto que já tinham ficado responsáveis pela promoção do Ano da Fé, promulgado por Bento XVI entre 2012-2013, para a revalorização do Catecismo. Na Santa Sé a Pontifícia Comissão Bíblica conversa pouco com o PCNE, enquanto que no Brasil a CNBB assegura a unidade entre Bíblia e Catequese pela Comissão para a Animação Bíblico-Cateqúetica, órgão responsável pela catequese e pela animação bíblica da pastoral. 

O novo Diretório deve muito também à experiência de Iniciação à Vida Cristã da América Latina. Além de assumir o catecumenato como inspiração para toda a catequese, o novo texto vaticano está repleto de intuições da Conferência de Aparecida. Há umas 7 citações, incluindo a de discursos de Bento XVI na abertura da conferência. Nenhuma outra conferência, de nenhum lugar do mundo, é citada. Seja lá quem forem os influentes latinos envolvidos com a redação do Diretório, eles trataram de incluir a perspectiva da Iniciação à Vida Cristã de inspiração catecumenal e de tornarem o Documento de Aparecida fonte de um texto da cúria romana, quando ninguém mais o é.

 Fisichella sustenta a necessidade de um novo Diretório a partir de dados sobre a situação de evangelização e iniciação cristã hoje na Igreja: a identificação da catequese com o esquema escolar, e a mentalidade de uma catequese feita para a recepção dos sacramentos. De fato, acho que o Diretório Geral para a Catequese (o antigo) já respondia a essas questões que nos interpelam ainda hoje, exceto no que se refere à novidade da cultura digital. Ele dá grande relevância a esse tópico. Pastoralmente, a prática dos catequistas no Brasil é bem deficitária nesse aspecto. Penso que a pandemia do Covid19 ajudou a demonstrar isso. Mas é um assunto complexo. Há muitos catequistas e catequizandos desprovidos de acesso à cultura digital. As realidades são muitas... Há ainda no nosso país um problema muito maior: o protagonismo dos conservadores nessa área digital (como Pe. Paulo Ricardo, vários YouTubers, o site "O Catequista" que têm livros publicados pela mesma editora que publicou Bento XVI no Brasil, etc). Enquanto isso, a CNBB e outras grupos que dependem da boa vontade de voluntários, ainda patinam nesse campo (veja, por exemplo, o site catequese do Brasil, mantido pela CNBB). O Brasil padece de uma televisionalização da devoção popular que cada dia toma ares de devoção midiática criada por grupos flertadores do governo Bolsonaro, e padece também de uma catequese doutrinária impulsionada por gurus digitais que ganham muito dinheiro com isso. Mas, talvez, para a CNBB, esse alerta do novo Diretório para a Catequese sobre a cultura digital, desencadeie novas iniciativas. 

Numa recentemente entrevista a uma jornalista amiga, quando ela me perguntou sobre os desafios da catequese no século XXI, eu disse: “O principal desafio para a catequese do século 21 é dar um passo definitivo na desescolarização da catequese que supere a mentalidade de “cursinho da fé para crianças”. A catequese de Iniciação à Vida Cristã de inspiração catecumenal é hoje o meio que a Igreja do Brasil orienta para colocar adultos, jovens e também crianças em contato com Jesus Cristo e ajudá-los a tornarem-se seus discípulos missionários. Abraçá-la e assumi-la é mais do que uma mudança de teoria, opção pedagógica, metodológica ou de técnica de comunicação. É tudo isso, porém é mais do que isso! Trata-se de uma renovação mais profunda, vivida pelos membros da comunidade inteira que são como que o verdadeiro audiovisual da catequese (Diretório Nacional de Catequese, n. 52). É abandonar o paradigma de catequese como meramente estudo de conteúdos da fé, e passar a compreender a catequese como processo para saborear a experiência do amor misericordioso de Deus e da amizade e desejo de seguimento de Cristo pelo impulso do Espírito que nos leva a comprometer com a transformação da realidade. 

O tempo de quarentena nos convida a olhar para a catequese desde casa como uma oportunidade para uma catequese personalizada de estilo catecumenal. “A Igreja deverá iniciar os seus membros – sacerdotes, religiosos e leigos - nesta ‘arte do acompanhamento’, para que todos aprendam a descalçar sempre as sandálias diante da terra sagrada do outro (cf. Ex 3,5)” (Papa Francisco, Evangelii Gaudium, n. 169). Não só os catequistas, mas todos os membros dos diversos grupos, movimentos e pastorais da comunidade podem colaborar nesse gesto de proximidade. Cada membro da comunidade pode acompanhar de forma personalizada um ou mais iniciandos e suas famílias, os conhecendo, ajudando-os e sendo testemunhas de seus percursos de fé e desejos de discipulado (cf. Ritual da Iniciação Cristã de Adultos, n. 42). Essa personalização da catequese é, na verdade, um ministério específico de quem aqui colocam-se como uma espécie de “introdutor” desses iniciandos. Nesse processo, se propõe um tempo de pré-catecumenato, que é o nome do 1º tempo em que um membro da comunidade faz o acompanhamento espiritual e pessoal de maneira informal e com simplicidade do iniciando e sua família que buscam a catequese.  Nesse 1º tempo é feito o anúncio querigmático, ou seja, é nesse período que o nome, ensinamentos, vida, promessas, chegada do Reino e mistério pascal de Jesus de Nazaré são anunciados por um tempo adequado aos iniciandos para lhes despertar a fé e prepará-los para a catequese propriamente dita. Pode-se para isso usar os textos bíblicos dos evangelhos da liturgia do Domingo por meio da Leitura Orante (Lectio Divina). Durante a quarentena, esse acompanhamento pode acontecer também online”.

Diretório Para a Catequese (2020) by João Melo on Scribd

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